Reinaldo Azevedo

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Opinião

Pesquisa 2: Percepção sobre economia ainda não é boa; Lula faz a diferença

A economia brasileira cresce acima do esperado; a inflação está sob controle; o desemprego é o menor em 10 anos, e a renda do trabalho cresceu 11,7% no ano passado, a maior expansão desde o Plano Real. Isso tudo é quase nota de rodapé no jornalismo econômico monotemático, ocupado quase que exclusivamente do binômio déficit-dívida — e, obviamente, não e diz aqui que isso não tem importância. Tem. Mas o país é um pouco mais amplo, não? A propósito: Jerome Powell, presidente do FED, acenou ontem com um corte nos juros dos EUA talvez nem tão distante. Lembrou que está, sim, vigiando a inflação, mas resolveu arrepiar os pelos liberaloides dos donos do debate no Brasil: disse que é preciso, sim, derrubar a taxa porque há de se zelar também pelo emprego e pelo nível da atividade econômica. Uma heresia para os idiotas daqui. Avancemos.

A avaliação de Lula e a do governo melhoraram em todos os cortes de renda, e são especialmente positivas entre os mais pobres. Há de haver algum motivo, não? Por enquanto, ao menos na expressão consciente dos que responderam as perguntas, ainda não é a economia que está fazendo a diferença, embora, insisto, os números sejam bons. Por que digo isso?

O humor com a economia azedou em fevereiro deste ano e não se alterou muito de lá para cá: 28% dizem que ela melhorou nos últimos 12 meses, e 36%, que piorou. Para 32%, está igual. Há dois meses, os números eram 38%, 27% e 32%. Há uma avaliação mais positiva entre os mais pobres, até dois mínimos: os que acham que melhorou foram de 33% para 37%; os que dizem que piorou, de 28% par 24%. Na faixa de dois a cinco mínimos e de mais de cinco, poucas variações no humor negativo.

Cada um sabe do seu bolso, claro, mas a maioria vê perda do poder de compra, e isso não aconteceu: afinal, temos o índice de inflação, sabemos a correção dos salários e os dados sobre a renda do trabalho. Ainda assim, 62% dos que recebem até dois mínimos afirmam que piorou; 65% entre os que recebem de dois a cinco e 62% no grupo que recebe mais de cinco. Ainda que a inflação esteja em índices civilizados, o descontentamento com o preço dos alimentos é gigantesco: 70% apontam que subiu. Não obstante, 52% apostam que as coisas vão melhorar.

Paul Krugman tem escritos seguidos textos a respeito da percepção dos americanos sobre a economia. Sim, a inflação ainda está alta por lá. E também os juros — para os padrões locais. Mas o país cresce, a pleno emprego. A maioria diz que sua vida econômica tem melhorado, mas que a economia vai mal — e não vai.

Bem, o fato é que os índices de Lula e do governo melhoraram sensivelmente sem que tenha havido uma mudança de percepção sobre a economia. Há o conhecimento e a aprovação de programas do governo: Bolsa Família (80%), Farmácia Popular (86%), Desenrola (73%), Pé de Meia (60%), Novo PAC (44%), Programa Acredita (38%). Mas isso não começou nos últimos dois ou três meses.

Então melhorou por quê?

Há muita coisa a pensar. Lula vem de uma jornada de entrevistas em rádios, veículo a que governos costumam, estupidamente, dar pouca atenção. Há, parece-me, a percepção de que Lula viaja menos -- sim, é um erro a censura a viagens, mas existe -- e dá mais atenção aos problemas internos. Nesses encontros, tem dito coisas com as quais a maioria ouvida na pesquisa concorda:
- salário mínimo deve ter aumento acima da inflação: 90%;
- juros no Brasil são muito altos: 87%;
- carne consumida pelos mais pobres deve ter isenção de imposto: 84%;
- é preciso fazer pente-fino nos benefícios sociais: 83%;
- o governo não deve satisfação ao mercado, mais aos mais pobres: 67%. Ele não disse exatamente isso, mas vá lá.

Dizem ter tomado conhecimentos dessas entrevistas 41% — é muita gente — contra 59% que afirmaram o contrário.

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Alguns bacanas andaram a dizer por aí que o presidente escorregou feio e coisa e tal. Será?

A síntese é a seguinte: a economia melhorou, sim, para a larga maioria, mas persiste o mau humor com a dita-cuja. Se a melhoria não aparece na pesquisa, mas já é de algum modo percebida, pode ter colaborado para mudança significativa na aprovação. A ver. Uma coisa é certa: o presidente Lula falando aos seus, para dentro, e participando dos embates políticos diretamente, como os números mostram, fazem muita diferença. Gostem (alguns) ou não.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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